Puro prazer


Gosto de escrever. Não importa sobre o quê. Escrever apenas. Escrever sem regras, por puro prazer. Depois, à medida que vamos crescendo, vai-se manipulando a capacidade natural de criar. As palavras estão no lugar certo, às vezes menos arrumadas, mas estão lá, nem sempre como deveriam estar porque existirá continuamente o sentido crítico. 


A expetativa de como os outros nos vão ler inibe o texto criativo. Escrever é soltar a mente, além de despertar qualidades mimetizadas. É importante cultivar rituais, eles ajudam a desenvolver a criatividade, e a mente usa esta faculdade apenas quando a experiência a obriga a fazê-lo.


Escrever ajuda-me a estabelecer contacto com questões internas e capacidades adormecidas. Tem um certo traço terapêutico e de autoconhecimento, ao mesmo tempo que assenta em características de espontaneidade.

Simples, sem receio de mostrar as emoções. A emoção é uma característica do ser humano, que nos distingue e dá caráter. Se um texto não tiver uma certa dose de emoção, não é verdadeiro, logo não transmite bem a mensagem. Quando escrevemos, fazemo-lo tendo em conta as nossas comoções e experiências. Depois há a utilidade. O desejar de que este texto seja útil para alguém.

Quando entro neste estado de entrega total, as ideias fluem. Ao longo da nossa vida experimentamos sentimentos muito diferentes, mas não basta apenas dar-lhes voz; eles precisam de ser escritos.

Não me importo com o que os outros pensam. Talvez, algumas vezes, já tenha deixado de fazer ou de escrever o que realmente queria com receio do que os outros iriam pensar. Senti que deveria dizer o que eles esperavam de mim, que deveria corresponder às suas expectativas. Depois, concluí que nunca deixarão de existir os que estão sempre dispostos a ver o lado negativo e a questionar o que quer que seja. Então, passei a agir segundo os meus próprios critérios. Na vida só importam aqueles que acreditam em nós, o que todos os outros pensam nunca será verdadeiramente importante. O tempo é suficiente para construir a nossa história e só essa prevalece.

Escrever é um hábito antigo e universal. Os primeiros diários pessoais de que se tem notícia eram chamados livros de cabeceira no Japão do século VIII. Todavia, só nos anos 70 os psicólogos compreenderam que o hábito de escrever sobre experiências individuais poderia ajudar as pessoas a ter uma vida mais saudável e plena. Além de funcionar como uma fuga para outros lugares, a transformação de sentimentos em palavras ajuda a organizar os pensamentos, as prioridades e o processo de amadurecimento pessoal. 

Escrever é uma forma de me comprometer comigo mesma, transformando a conceção em palavras, que podem ser lidas, analisadas, sem controvérsias nem evasões, que muitas vezes acontecem quando se limitam apenas aos pensamentos. 

Não sei exatamente o que me move, mas escrever, para mim, é uma forma de criar laços, é uma necessidade. 

“No fundo, todos temos necessidade de dizer quem somos e o que é que estamos a fazer e a necessidade de deixar algo feito, porque esta vida não é eterna e deixar coisas feitas pode ser uma forma de eternidade.” José Saramago, La Provincia (1997).


Sem comentários:

Enviar um comentário