Quatro lugares à mesa, tudo pronto para a consoada, mas uma estranha sensação de vazio invade esta celebração. Natal é a festa da família e dos afetos. E quando a família não está completa? Como lidar com isso? Depois de um ano tão atípico, com todos os constrangimentos que a COVID-19 nos trouxe, o Natal de 2020 é, certamente, diferente e as famílias sentem-se obrigadas a estar mais afastadas do que nunca. 


A 31 de dezembro de 2019, a Organização Mundial de Saúde dava conta de que mais de duas dezenas de casos de pneumonia de origem desconhecida tinham sido detetados na cidade chinesa de Wuhan, na província de Hubei. Tratava-se então de uma doença anónima e distante, que infetava e matava pessoas do outro lado do mundo. Um ano depois, à escala mundial, já morreram mais de um milhão de pessoas e ficaram infetadas mais de 55 milhões. O álcool gel e a máscara substituíram os beijos e os abraços.

Mas o Natal continua a ser tempo de dar, de receber, de distribuir sorrisos. É a época em que o amor parece renascer dos pequenos gestos, mas é por defeito a celebração em que as vulnerabilidades ganham mais significado e intensidade. Não é apenas uma questão de presença física, mas sim de ausência. Através da família desenvolvemos os primeiros laços com o mundo, recebemos os valores básicos e as atitudes que estruturam a nossa personalidade e alicerçaram o nosso compromisso com a vida. É na família que construímos a nossa identidade. Se a socialização é crucial para o ser humano, é uma questão de sobrevivência para a família.

Este ano, na noite de consoada, haverá lugares vazios em tantas mesas, uma saudade que ficou, um sentimento enorme daquilo que já foi, mas que continua a ocupar muito espaço dentro dos corações. Existirão memórias, umas doces, outras amargas, mas é Natal e tudo deveria transformar-se numa amena magia!

O pinheiro foi decorado, as figuras principais do presépio também marcam presença, mas a estrela não brilha como em outros natais. O novo coronavírus não tem contemplações, é implacável para os que se entregam aos afetos. Esta é uma realidade que não deixa dúvidas, nem espaço para grandes celebrações. Em 2020, muitas pessoas vão escolher passar o Natal longe do resto da família. Na base dessa decisão está um ato de amor e um sentido de proteção.

Continuo a acreditar que a melhor mensagem de Natal é aquela que sai em silêncio de dentro de nós e que aquece com ternura os corações daqueles que nos acompanham na nossa caminhada. Ouçamos o silêncio, mas é tão avassalador e cheio de interrogações! Valerá o esforço? Teremos outros natais? Nunca, como neste ano, vimos tão pouco os nossos pais e avós. Nunca, como neste ano, fomos tão privados dos afetos. Nunca, como neste ano, as celebrações familiares adotaram contornos tão severos.

No dia 2 de março foram confirmados os dois primeiros casos de Covid-19 em Portugal.
Os meses passaram e fomos sendo subjugados por um "novo normal". Portugal é dos poucos países em que a segunda vaga está a matar mais do que a primeira. Por detrás dos números estavam pessoas com rosto, com nome, com família. Quebraram-se os laços.  Quando se fala em mudanças, não poderemos enumerá-las. O mundo transformou-se drasticamente. 

A 8 de dezembro, Margareth Keenan, uma inglesa de 90 anos, foi a primeira pessoa a ser oficialmente vacinada com a vacina da BioNTech-Pfizer. A esta vacina juntaram-se outras de vários projetos e laboratórios.

A ciência e o trabalho perseverante de muitos investigadores espalhados pelo mundo são absolutamente extraordinários. Será este o princípio do fim? Finalmente, existe uma luz ao fundo do túnel, mas o caminho ainda é penoso. Vivem-se tempos contraditórios em que alguns ainda continuam a insistir que a Terra é plana. Os nossos comportamentos individuais continuarão a fazer diferença entre a vida e a morte, a nossa, a dos nossos e a dos outros. Acredito que iniciámos uma nova era, onde os sorrisos deixarão de ser opacos e passarão a ter cor.

Entretanto é Natal, celebremos a saúde e a vida! As saudades são exponenciais e ampliam a falta dos abraços, mas o mais importante será sempre celebrar mais um Natal e o amor que nos une. 

Termino evocando Ary dos Santos: 

«Natal é em dezembro
Mas em maio pode ser
Natal é em setembro
É quando um homem quiser…»

Feliz Natal!

"Fica no cimo de Portugal, como os ninhos ficam no cimo das árvores para que a distância os tome mais impossíveis e apetecidos". Hoje invoco Miguel Torga porque ao fazê-lo celebro as minhas origens, o mais íntimo do meu ser, as minhas gentes. 
“Embora muitas pessoas digam que não, sempre houve e haverá reinos maravilhosos neste mundo.” Trás-os-Montes é, segundo Torga, um desses reinos que todos podem ver, desde que "os olhos não percam a virgindade original diante da realidade e o coração, depois, não hesite". Miguel Torga pode estar certo de que ninguém hesitará perante reino tão sublime! 

Mas quem foram os primeiros transmontanos? Muito antes das invasões romanas, por volta de 218 a.C. sabe-se que já habitavam na Península Ibérica os povos Ibéricos. Para melhor entender a origem transmontana, é necessário fazer uma viagem ao passado, até à pré-história da Península Ibérica. Ser transmontano é carregar, assim, séculos de história de um reino e das suas gentes singulares, é reconhecer o cheiro da urze e perceber que apenas o céu é o limite. É não esquecer o aroma da terra quando chove nas tardes quentes de verão e o chilrear dos pardais quando desperta a primavera. 

Todos temos fraquezas e fragilidades. Talvez as encaremos de forma diferente, em alturas distintas. As circunstâncias tornam-nos mais autênticos e mais conscientes das nossas fraquezas. O carácter guerreiro e lutador dos transmontanos não nos impede de demonstrar a nossa fragilidade. A imperfeição é uma caraterística dos mais fortes. 

Nasci com um pé na terra e outro no céu, escalei fragas e montanhas, escrevi poesia e, nas entrelinhas, pude perceber, desde muito cedo, a importância da dureza e da coragem. No interior não existem verdades fáceis, há apenas honestidade e franqueza de carácter. Os transmontanos conheceram bem (ou continuam a conhecer) o peso da interioridade. 

Sente-se um calafrio. A vista perde-se de deslumbramento, nada é comparável ao grande “oceano megalítico”. A cada regresso, encontro novamente o mais alto grau de paz interior, numa conexão plena com a natureza, com a minha consciência, sem nunca esquecer os alicerces que me moldaram o caráter. 

Passemos de novo a Miguel Torga. 
“- Entre! 
A gente entra, e já está no Reino Maravilhoso”. 

Em Trás-os-Montes existe mística e harmonia, dureza estampada em cada fissura, fé inabalável na natureza. Assim como as estações, a vida tem ciclos. Existirão sempre os dias e as memórias antigas de um verão repleto de risadas, de muitas aventuras e de calor. Mas, depois do verão, ficaram as memórias eternas dos que já partiram, do outono tisnado e do inverno gelado, com sabor a lareira, a castanhas e jeropiga, e a dias de chuva e de neve carregados de tantos afetos! Depois, a primavera volta a chegar. A vida ganha novo fôlego, e as circunstâncias mudam. 

O nome transmontano quer dizer filho de Trás-os-Montes, e, tal como Miguel Torga, este é o meu o Reino Maravilhoso. 

A terminar recupero uma frase de José Saramago: “nós somos muito mais da terra onde nascemos, e onde fomos criados, do que imaginamos”. Ser transmontana não é uma coincidência, é um privilégio! 

Os alunos desenvolvem o seu processo educacional em dois grupos distintos: a família e a escola. Em família, vivem e compartilham as experiências pessoais, os seus medos e receios. No universo escolar, devem aprender a ser pessoas livres e felizes, assertivas e solidárias. É fundamental o exercício da criatividade, como elemento de impulsão no processo educativo. A propósito, partilho convosco um texto elaborado pelo meu filho Simão, que frequenta o 6ºano, para a disciplina de Português, inspirado num desenho a carvão, também feito por si. 

Para se poder ser membro irrepreensível de um rebanho de carneiros é preciso, antes de mais, ser-se carneiro. Segundo Albert Einstein, “criatividade é inteligência, divertindo-se”. Estará a escola preparada?


«A história que vou contar-vos fala sobre uma cidade, mas não sobre qualquer uma, esta é a cidade da vida. Está no alto do céu e é transportada por uma grande águia, que tem olhos azuis como o mar e uma plumagem de espantar qualquer um. Leva agarrada a si uma lanterna que simboliza a luz. 

Esta cidade não é habitada por humanos, mas sim por anjos e todos os outros seres que não fazem mal ao mundo. Por sua vez, a cidade tem poucos prédios, mas há espaço para todos. 

Um certo dia, a morte foi confrontar a vida. Então foi à cidade e transformou tudo o que era belo e iluminado, num sítio frio e escuro. Os anjos lutaram contra os demónios e as águias contra os cavalos do mal. A morte parecia querer acabar com tudo e com todos, a terra ficou assombrada. A felicidade refletiu-se em tristeza e o amor em ódio. 

Porém, a vida começou a revigorar-se e conseguiu destruir as trevas que habitavam a terra e a felicidade voltou. A vida voou de novo para o céu e com a sua força atacou o mal que lá residia, derrubando tudo o que lhe fazia frente. Os anjos morreram e a vida quase tinha desaparecido, mas de repente, provando que os milagres existem, tudo ressuscitou. A vida voltou, as trevas morreram e tudo se transformou no paraíso. 

A vida sempre ganhará, ela consegue acabar com o mal do mundo e nós somos muitas vezes a prova disso mesmo, ajudando os que mais precisam. Infelizmente, os humanos também contribuem para a morte, por exemplo de muitas espécies do nosso planeta, e ao fazerem mal uns aos outros. 

Existe apenas uma certeza, a de que todos devemos lutar para construir o amor porque ele é a nossa maior arma. Muitas vezes não percebemos que as cicatrizes que não conseguimos ver são as mais difíceis de curar, mas o amor tudo supera!» 

Texto e desenho a carvão: Simão Antão, 11 anos

A vida sempre ganhará

by on novembro 04, 2020
Os alunos desenvolvem o seu processo educacional em dois grupos distintos: a família e a escola. Em família, vivem e compartilham as experiê...
Há um suicídio a cada 40 segundos. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde ocorrem cerca de 800 mil suicídios por ano, em todo o mundo. Porquê? Questionamos. O suicídio parece não ter explicações objetivas. Agride, aterroriza e silencia. O ser humano é feito de sombras que o perseguem. 


Em algum momento da vida, todos já equacionámos a morte. Se não desejámos morrer, ao menos refletimos sobre ela para escapar ao sofrimento ou para exigir atenção. Dentro da nossa coerência, o suicídio surge como um ato de loucura, uma opção contranatura, em que a vítima e o agressor são a mesma pessoa. Por trás deste ato está um mundo indecifrável que não cabe em definições complexas, muito menos elementares. Há um interromper do ciclo natural da vida e uma luta incessante de “porquês” para os que cá ficam.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, mais de 90% dos casos de suicídio concretizados estão relacionados com transtornos mentais, depressão e abuso de substâncias psicoativas. 

O apoio da família e dos amigos é essencial, mas o suicídio é quase sempre um grito mudo, uma dor silenciosa, um caminho sem sentido cuja prevenção e o controlo não são inteligíveis. 

O suicídio é visto como uma forma de lidar com o sofrimento, uma saída para aliviar a dor. O desespero torna-se insuportável. A cada dia, o sofrimento fica mais violento e viver torna-se angustiante. O suicida não sabe se quer morrer ou viver, deseja apenas fugir da dor, não quer acabar com a vida, mas sim com o sofrimento. 

Cometer suicídio é destruir uma ligação, que vai deixar um espaço vazio, onde não existem respostas, muitos menos coragem ou cobardia. 

Por vezes a vida parece curta, mas o caminho pode ser longo. Em tempos de intolerância, em que quase tudo serve de argumento e as possibilidades de diálogo permitem quebrar limites e ultrapassar barreiras, são importantes momentos de introspeção para perceber quem somos, de onde vimos e para onde vamos. Não há espaço para o lirismo contemplativo, a decisão de acabar com a própria vida não é individual, surge sempre de uma motivação, de um vazio coletivo. O suicídio pode ser um ato privado, mas não representa somente uma violência contra o próprio, mas também contra os demais. 

Saber escutar é uma força poderosa nas relações humanas. Muitas vezes não necessitamos de encontrar soluções para os problemas dos outros, apenas aprender a ouvir. Quando sabemos escutar, as pessoas conversam e refletem sobre seus conflitos e emoções, encontrando as respostas e as soluções dentro de si. 

No dia 10 de setembro assinala-se o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio. Se é verdade que o sofrimento existe, também é certo que haverá sempre um céu estrelado, uma lua crescente, um sol a cada novo dia para ser contemplado. A vida está sempre em transformação. O melhor ainda está para vir. Tudo chega com o tempo. 

“Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido”. (Fernando Pessoa)

É agosto. 

Mais contido e distante, trouxe consigo lembranças de agostos passados. 


Os amantes da astronomia voltam a procurar no escuro céu a conhecida "chuva de estrelas ou de Perseidas”. Também para estes, agosto não será igual. Além da Lua parecer estar amuada, a constelação de Perseu no horizonte noturno também não vai estar no melhor local para a observação. 

Agosto apresenta-se no seu esplendor. Sinónimo de férias, família, amigos, esplanadas, passeios e praia. 

Todavia, estamos em 2020 e, se aparentemente existe uma normalidade que parece sobreviver ao toque do cotovelo, agosto será diferente. Sem festas e romarias, sem festivais de verão, sem muitos imigrantes que não puderam regressar ao seu País, agosto sobrevive, escondido por de trás das máscaras que nos cobrem os rostos, escondem os sorrisos e mascaram os afetos. 

Ainda assim é agosto e através da desordem que bruscamente se instalou nas nossas vidas, conseguimos crescer, tornámo-nos resilientes e chegámos até aqui. 

Viktor Frankl, psicoterapeuta que sobreviveu a Auschwitz e escreveu o livro “O Homem em Busca de um Sentido”, já dizia as sábias palavras: «quem tem um “porquê?”, enfrenta qualquer “como?”». 

Ainda estamos em agosto, cheira a maresia e a gin tónico, como que a brindar a vida que nos presenteia. Aproveitemos para sonhar, fazer planos, mas agosto é hoje! Amanhã já será setembro.


Sempre ouvi dizer que para conhecermos os amigos é necessário passar pelo sucesso e pela desgraça. No sucesso, verificamos a quantidade e, na desgraça, a qualidade. O projeto Europa é uma utopia, no sucesso somos todos bons amigos, na desgraça, fugimos com “o rabo à seringa”. 
No fim do Conselho Europeu extraordinário, na passada quinta-feira, para discutir a reação europeia à crise do novo coronavírus, António Costa mostrou-se bastante exasperado com a reação de alguns países. A Holanda, mais uma vez, não se portou bem, mostrou claramente o que não se espera da Europa, agindo numa clara antítese ao que deverão ser os valores europeus. O ministro das Finanças holandês, Wopke Hoekstra, em desacordo com a ideia dos coroabonds referiu que alguns países da União Europeia tinham acumulado reservas, enquanto outros, como a Itália e a Espanha, não o tinham feito. Numa declaração cáustica e rara entre líderes europeus, o primeiro-ministro português classificou esta atitude de “repugnante" e "mesquinha". Costa foi duro? Não. Foi reto, justo e acima de tudo deu uma lição de solidariedade àqueles que acham que a Europa é um fantoche que cada um pode usar quando e como lhe der jeito. Há muito que os valores europeus estão ultrapassados, há muito que alguns países se consideram prima-donas. Este deverá ser o momento para a Europa concretizar os valores que defende, enfrentado unida uma crise sem precedentes ou deixando-se minar pelos habituais “frugais”. 

Não nos esqueçamos que esses países ditos "frugais" ou "forretas" são dos que mais beneficiam economicamente da existência de um mercado único europeu e esquecem-se que esse ganho ultrapassa largamente o valor das suas contribuições para o quadro financeiro plurianual. Mas, mais do que isso, esses “frugais”, os mesmos que querem cortes maiores na política da coesão e na política agrícola, os mesmos que se mostram irredutíveis perante uma pandemia que assola o mundo e que, como António Costa bem disse, não foi criada nem importada por Espanha, estão entre os que mais beneficiam per capita em termos líquidos da existência do mercado europeu. Muito mais do que Portugal ou Espanha, por exemplo. 

Costa esteve à altura, mostrando que já não aguenta mais insolências vindas da Holanda, realçando ainda que "essa mesquinhez recorrente mina a UE e é uma ameaça à própria UE". Como que trilhada na garganta, o primeiro-ministro português recordou ainda a insinuação de Jeroen Dijsselbloem, o antecessor de Hoekstra, quando se referiu aos países do sul sugerindo que gastavam o dinheiro em copos e mulheres. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, colocou-se, e muito bem, ao lado do primeiro-ministro, mostrando que Portugal já não tem paciência para lições holandesas. Numa atitude de líder, António Costa não se inibiu de reforçar: "Já era insuportável trabalhar com o sr. Dijsselbloem, mas há países que insistem em mudar os nomes, mas em manter pessoas com o mesmo perfil". 

Tempos difíceis exigem medidas firmes. Mas as pessoas terão de estar sempre em primeiro lugar. A humanidade luta pela sobrevivência, e cada um terá de fazer a diferença, mesmo quando todos somos chamados a intervir. 

Hoje o Papa Francisco rezou pela Humanidade, numa cerimónia transmitida a partir da praça de São Pedro, impressionantemente vazia, encharcada pela chuva, envolta num anoitecer, que se estendeu para o resto do mundo 

“Desde há semanas que parece o entardecer, parece o cair a noite. Densas trevas cobriram as nossas praças, ruas e cidades; apoderaram-se das nossas vidas, enchendo tudo de um silêncio ensurdecedor e de um vazio desolador, que paralisa tudo à sua passagem: pressente-se no ar, nota-se nos gestos, dizem-no os olhares. Revemo-nos temerosos e perdidos.” 

O Papa terminou esta oração dando a bênção em várias direções, e os sinos da basílica ecoavam pela praça e pelos nossos corações. A Praça de São Pedro, sempre repleta de multidões, continuava assustadoramente vazia, mas lavada pela chuva, como se a nossa vida fosse assim renovada, através de uma oração abençoada. 

No contexto atual, de apreensão e incerteza, também a Europa não pode ficar aquém daquilo que os cidadãos esperam dela. Deve ter uma posição clara e de liderança porque esta crise é de todos, incluindo alemães, holandeses, finlandeses e austríacos. 

Se num mundo inevitavelmente conectado, António Costa mostrou que a solidariedade deverá ser a política central, o chefe máximo da Igreja Católica lembrou que “Estamos todos neste barco. É tempo de reajustar a vida. Ninguém se salva sozinho.” 

PS - Sou apartidária e uma não especialista em assuntos económicos.

Estranha forma de vida esta que nos faz estremecer perante a calma aparente que se vislumbra pelas nossas cidades, ruas e até mesmo na nossa esfera de amigos. O silêncio torna-se avassalador, alguém que se aproxime de nós é visto como um estranho ou um suspeito. O simples ato de tossir tornou-se numa ofensa nunca antes vista. Desconfiamos de todos e todos desconfiam de nós e esta desconfiança mantém-nos prisioneiros de um inimigo invisível. 

Habituados a traçar o nosso caminho e a ter tudo sobre controlo, encontramo-nos no meio de uma encruzilhada que não sabemos para onde nos levará. Mais do que nunca, o mundo paralisou perante o vírus do medo, o Covid-19, que originou a maior pandemia do século XXI. Voltemos à encruzilhada. Um caminho leva ao desespero. O outro à total incerteza. Teremos nós sabedoria para saber escolher? Além dos aspetos sociais e psicológicos, que danos infligirá à Economia, à Democracia, à Educação e à Saúde? 

Num gesto simbólico, milhares de portugueses, em isolamento em casa, foram até às suas varandas ou janelas homenagear e agradecer aos profissionais de saúde, pelo trabalho desempenhado nas últimas semanas no combate à Covid-19. Os portugueses responderam em massa, através do apelo nas redes sociais "#SomostodosSNS". Duas lições a retirar: o Serviço Nacional de Saúde e os seus profissionais, tantas vezes criticados e censurados, estão agora na linha da frente; numa era de solidão digital em que há, cada vez mais, quem viva de “likes” e do número seguidores, as redes sociais, consideradas por muitos como uma espécie de “epidemia” dos tempos modernos, poderão agora ajudar a mitigar a solidão social.

Haverá um antes e um depois Covid-19. A Humanidade é dizimada por uma guerra mundial sem precedentes, em que todos parecem ser vencedores e vencidos. A 31 de dezembro de 2019, a Organização Mundial de Saúde dava conta de que mais de duas dezenas de casos de pneumonia de origem desconhecida tinham sido detetados na cidade chinesa de Wuhan, na província de Hubei. Tratava-se então de uma doença anónima e distante, que infetava e matava pessoas do outro lado do mundo. Quase três meses depois, sabemos que o vírus não respeita fronteiras e as fronteiras também não respeitam o vírus. Entre os infetados há ministros, escritores, atores, médicos, treinadores, atletas. Transcende as barreiras sociais e afeta todos os dias novos países e territórios. Estamos numa guerra à escala global.

Segundo dados publicados na Direção Geral de Saúde (DGS) já existiam mais de 180 mil casos confirmados (em 16/03/2020), mais de 7000 mortos, em 148 países, áreas ou territórios. O número de infetados em Portugal pelo novo coronavírus subiu para 448 e existem mais de 3500 casos suspeitos. Números estes que aumentam a uma velocidade incontrolável e que daqui a dias estarão completamente ultrapassados. A ser decretado o estado de emergência será a primeira vez que tal acontece no Portugal democrático, pós-25 de Abril.

A ministra da Saúde, Marta Temido, tem repetido que para evitar a propagação do surto é fundamental que todas as pessoas respeitem as indicações das autoridades de saúde. Por cá, alguns vivem revoltados contra aqueles que já se encontram em casa, em teletrabalho, desconhecendo que estes estão também a contribuir para os proteger. Outros preferem assobiar para o lado, esquecendo-se de que a responsabilidade social significa um compromisso com a vida, a nossa e a dos que nos rodeiam. Dizem que os ignorantes são mais felizes!

Se vivêssemos na antiguidade, a explicação para esta calamidade seria facilmente atribuída à ira divina dos deuses, ou às porfias da natureza. Hoje o Covid-19 põe-nos à prova, testa a nossa capacidade de resiliência. Atira-nos para dentro da própria família, criam-se laços dentro dos lares que há muito não existam. O novo vírus devolve-nos o tempo atrás do qual todos corríamos freneticamente. Torna-nos prisioneiros da nossa própria liberdade e mostra-nos de uma forma demasiado dura que a Humanidade será aquilo que fizermos dela. Ironicamente, surge como um antídoto para o nosso próprio veneno.

Atualmente, o Covid-19 está no centro das nossas vidas, e nós que eramos o centro do mundo passamos a ter o mundo inteiro dentro das nossas casas. Um mundo demasiado pequeno, mas carregado de afetos. Mas, o Covid parece não ter deixado nada ao acaso e alterou sem pudores relações e comportamentos. Não há nada mais gratificante do que o afeto, nada mais perfeito do que a reciprocidade dos mesmos, mas o caminho ainda é longo e exige muita, muita contenção.

Perder uma batalha não significa perder guerra, e a vida é constituída de muitas e incansáveis batalhas. E se estamos em plena batalha não nos podemos esquecer de que uma guerra nunca se vencerá lutando sozinho.
O final de um ano convida sempre à reflexão. É um bom momento para olharmos para nós  e para os outros. Ao fazê-lo não consigo esquecer 2018. Foi um ano de provações e acontecimentos. Foi um ano em que conheci e perdi algumas das melhores pessoas. Foi um ano que vi algumas partirem, quando pensei que iriam permanecer junto de mim para sempre. Desde então tive que aprender a lidar com cada uma dessas partidas. Acabei por perceber que desistir nem sempre é um gesto de fraqueza, mas de valentia. Em 2019, aprendi que temos de seguir em frente, mesmo quando sentimos vontade de voltar atrás.


E estamos em 2020. Se o ditado diz “ano novo, vida nova”, a prática é impiedosa ao mostrar-nos que novos planos se transformam, quase sempre, em velhos hábitos. O que existe é apenas o momento. Nos desejos para o novo ano espero que possamos ir mais longe e caminhar ainda mais juntos, em busca de um mundo melhor, que privilegie os afetos. Sem hipocrisias, sem manipulações, sem relações vazias.

O início de um novo ano é tempo de festa e celebração, mas também pode ser tempo de análise e recomeço. Para trás fica o ano que agora finda, e deste devemos guardar os bons ensinamentos e esquecer os menos bons. 

Sobre o tempo, não gosto de fazer balanços. Entre tantas exigências do quotidiano, são muitas as vezes em que não conseguimos absorver o que é realmente fundamental para a nossa vida! 

Gosto de refletir. Gosto de procurar respostas. 

Como vivi o ano que acabou? Foi um ano de desafios e conquistas? Ofereci abraços a quem precisou? Pedi desculpa? Fui amiga dos meus amigos? Ajudei os meus colegas? Estive presente na vida da minha família? Mas, depois de tantas perguntas uma outra sobressai: será que ainda teremos tempo? Para um pedido de desculpas, uma reconciliação, uma nova amizade, uma dor esquecida, um grito, um beijo, um abraço? 

Um ano finda para que outro se inicie. É assim na natureza, assim são os dias, assim é nossa vida. Assim somos nós. 

Existirá sempre alguém que nos amará com plenitude. Existirão sempre lugares onde seremos recebidos com sorrisos e abraços verdadeiros. Desde que guardemos os nossos sentimentos intactos, dentro de nós, as pessoas certas nunca deixarão de estar nos lugares precisos. 

Que o Ano Novo renove as nossas esperanças e as nossas prioridades, e que a estrela de cada um ilumine 2020. Desejo que continuem ter sonhos grandes e que eles possam mover-vos a cada instante. Desejo-vos todas as cores da vida. Todas as alegrias. Todas as melodias. Todos os poemas. 

Neste novo ano, desejo que os amigos sejam mais cúmplices. Que a família esteja mais unida. Que a vida seja vivida com mais intensidade e afeição!

Que em 2020 as estrelas brilhem ainda mais fortes, iluminando o nosso caminho. Que possamos esperar, reunidos à mesa, a chegada dos sonhos que partiram e das metas que conseguirmos alcançar. E quando voltarmos de mãos vazias, juntos possamos erguer taças de amizade com força suficiente para seguir um novo recomeço. 

Todo jardim começa com um sonho de amor. Quem é que não gosta de flores?

Muita harmonia para 2020. Feliz Ano Novo!

Feliz Ano Novo!

by on janeiro 04, 2020
O final de um ano convida sempre à reflexão. É um bom momento para olharmos para nós  e para os outros. Ao fazê-lo não consigo esquecer 201...